O intraempreendedorismo não funciona se você o fizer sozinho.
O intraempreendedor que criou a Nespresso não o fez sozinho. Anna Maria, sua esposa, foi a incentivadora, Eugenio, o barista do café Saint-Eustaquio em Roma, ajudou com o insight que baseou a ideia. O time da Nestlé no Japão aportou os recursos para o desenvolvimento do protótipo. O então diretor da Nestlé Helmut Maucher autorizou a fundação da nova empresa. Portanto, sozinho você tem ideias, em time você as transforma em inovações. Ninguém faz nada relevante sozinho.
Então, se você está pensando em focar no intraempreendedorismo e fazer algo inovador dentro de uma empresa estabelecida comece a articular aliados de forma paciente e cuidadosa. Mas não se esqueça que o jogo político dentro das empresas é duro. Portanto, fingir que não existe não vai ajuda-lo. Cada pessoa tem suas prioridades e interesses. O Gerente de marketing quer virar diretor. O Head de RH quer ser expatriado para a matriz. E assim, todos querem ficar bem na foto. Ninguém quer trabalhar mais ou tomar riscos desnecessários a sua carreira.
Para ilustrar essa situação vou compartilhar uma experiência pessoal de intraempreendedorismo num ambiente bem diferente do que você pode imaginar.
Minha história com o intraempreendedorismo
Durante 4 anos, em paralelo as atividades da Innoscience, realizei trabalho voluntário como conselheiro do Sport Club Internacional, clube de futebol gaúcho pelo qual meu falecido pai me ensinou a amar. Um clube de futebol de primeiro nível fatura, atualmente, centenas de milhões de reais. Tem centenas de funcionários e milhões de clientes apaixonados que consomem, diariamente, seus produtos e serviços. Entretanto, o problema é que no final do campeonato, somente um clube pode levantar a taça. Por um lado, os clubes são organizações sociais, mas por outro, são grandes empresas. Os clubes tem um ambiente politico muito desenvolvido pois a governança (a alta gestão) é, normalmente, eleita pelos sócios com mandato definido o que os assemelha a gestão pública.
Em 2010, o Internacional tinha a oportunidade de reformar seu estádio, o mítico Beira-Rio, mas não dispunha de recursos nem consenso dos 350 conselheiros do clube sobre como fazer essa transição do negócio existente para o novo. Fui então convidado para uma reunião com o Presidente do Clube para falar sobre formas de viabilizar o projeto e, tempos depois, lá estava eu imerso no tema como Presidente da Comissão de Obras de reforma do estádio. Então, ao longo dessa jornada aprendi a relevância de saber quando acelerar e usar a minha inquietação e quando ter a paciência de saber que há coisas que precisam de tempo para acontecer.
O resultado do intraempreendedorismo dentro do SCI
Enfim, depois de 4 anos de trabalho voluntário, o estádio foi reinaugurado, teve uma nova configuração de produtos que valorizava os novos espaços e necessidades de diferentes perfis de torcedores. O clube adicionou R$ 20 milhões de reais por ano em receita de sócios e bilheteria. Não foi um processo fácil. Pelo contrário. O auge da dificuldade ocorreu numa reunião do conselho para aprovação da nova definição dos produtos quando um conjunto de 70 torcedores faziam cânticos nada amistosos com meu nome fora da sala de reuniões. Depois de aprovar o projeto por unanimidade, esses torcedores começaram a arremessar pedras e tijolos na minha direção e de integrantes do time de trabalho ao saímos da reunião.
Calma! A sua experiência intraempreendedora pode ser bem mais tranquila. Pelo menos não tão emocional como inovar num clube de futebol. Mas posso garantir que não vai ser menos demandante de tempo, envolvimento e preparação. Essa jornada me ensinou algumas coisas que acredito possam ser muito úteis na sua jornada como intraempreendedor.
7 coisas que você precisa fazer dentro do intraempreendedorismo
1. Forme um time com perfis complementares e engajado
Unimos profissionais de dentro e de fora do clube. Selecionamos parceiros como escritório de advocacia e auditoria de primeira linha. Juntamos experts das áreas de marketing, construção, arquitetura e negócios. Com base num propósito e visão muito claros conseguimos fazer com que pessoas dedicassem seu tempo de forma voluntária, isso mesmo, durante quatro longos anos.
2. Entenda os interesses dos principais stakeholders envolvidos
Cada peça do quebra cabeça quer uma coisa. Mapeie todos eles. Formalize o entendimento de suas ambições junto ao seu time de trabalho. Entenda como isso impacta no seu projeto. Uma parcela dos torcedores queria lugares marcados enquanto que outros preferiam uma área livre por ordem de chegada. Saiba dosar ambição com viabilidade de execução. Erramos, á época, por exemplo ao não prever uma área onde todos pudessem ficar assistindo o jogo em pé por exigência da FIFA para a Copa do Mundo.
3. Engaje os stakeholders o mais cedo possível na jornada
Ninguém gosta de subir no ônibus lotado com uma responsabilidade definida por terceiros. Os grupos mais ferrenhos opositores que enfrentamos foram aqueles que deixamos para engajar mais tarde na jornada. As vezes o tempo é curto e as atividades intensas. Cuidado para não deixar alguém relevante para trás.
4. Estruture um storytelling consistente e o sustente com dados e fatos
A mensagem precisa ser clara, concisa e consistente. Na época definimos o projeto como “Novo Corpo, Mesma Alma”. Comunicava com clareza o que seria transformado e o que permaneceria igual. A lógica do por que fazer o movimento, os riscos de não fazer, o passo a passo e o papel de cada um foram detalhadamente elaborados. Para dar consistência fizemos uma série de benchmarks nacionais e internacionais além de montar cenários diversos. Conseguimos dimensionar o impacto de forma objetiva. Com isso acessamos coração e cabeça de todos envolvidos.
5. Compartilhe status e os resultados com todos ao longo da jornada
Ao longo da jornada sistematizamos comunicados internos e externos. Aproveitamos as redes sócias para comunicar com os torcedores e as reuniões do conselho para manter alinhamento com os conselheiros. Fomos disciplinados na realização de encontros periódicos com todo time de trabalho. Para manter os aliados do seu lado será preciso alimenta-los com informações continuamente.
6. Tenha paciência e dedique muito tempo para sensibilizar e explicar o projeto
O intraempreendedor é um inquieto que tem uma visão e muito trabalho. Deixar de dedicar tempo para interagir com todos stakeholders pode ser crítico. Na hora da aprovação do projeto você não vai querer ser surpreendido com algo que poderia ter antecipado. Não foram poucas as reuniões de venda do projeto que fizemos a noite e aos sábados para convencer todos participantes.
7. Esteja aberto e flexível para fazer alterações que aumentem as chances do projeto dar certo
Ter convicção é importante. No entanto, não confunda a sua visão com seu projeto. Em uma das reuniões de apresentação da ideia recebemos feedbacks que exigiam ajustes da nossa proposta. Parte do time viu aquilo como uma derrota. Na realidade era a oportunidade de pivotar a solução para algo viável. Você não vai inovar se tentar fazer algo que não será aprovado e executado. O ótimo é, muitas vezes, inimigo do bom.
Se der certo, seja humilde e distribua os louros da vitória: O dia da inauguração do estádio aparece até hoje, todo dia, na minha cabeça. Nesse dia fui com meus amigos e parentes ao jogo. Fiquei na sombra. Tínhamos diversos protagonistas. Todos queremos ter reconhecimento mas é nesse momento que você deve conter o seu ego e compartilhar as conquistas com todos envolvidos.
Enfim, se você não tem paciência e tato para lidar com pessoas engavete seu projeto de intraempreendedorismo Mas se realmente quer transformar algo em uma empresa estabelecida saiba bem quem são os principais aliados e seus interesses, dedique tempo, engaje-os desde o inicio e saiba comunicar com clareza o storytelling e as evoluções do projeto para, quando necessário, proceder os ajustes que levarão você e seu time a levantar a taça!
Empolgado com a nossa jornada? Já começou a formar o seu time?
Autor do artigo: Maximiliano Carlomagno
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